Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo, o que me falha ou finda, é como que um terraço sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio do que não está ao pé, livre do meu enleio, sério do que não é. Sentir, sinta quem lê! [Fernando Pessoa, in "Cancioneiro]

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quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Teoria Literária

 
O leitor comum, ao desfrutar de uma obra, dificilmente pensará em teorizar sobre ela. Mas, na verdade, desde a era dos antigos gregos havia já uma preocupação em compreender a literatura e seus meandros, seus vários ângulos. Pode-se dizer que com as obras de Homero, Odisséia e Ilíada, nos séculos V e IV a.C, nasceu a necessidade de construir a Teoria da Literatura.

Nestas criações homéricas eram analisados o papel, a fonte e a essência da literatura, que detinha, entre outras qualidades, o poder de seduzir as pessoas, quando elas se reuniam para ouvir a narração de histórias, ainda no seu estágio oral. 
 
Platão, em A República, e Aristóteles, na Poética, teorizaram mais profundamente sobre os aspectos literários, sendo atualmente considerados os pioneiros das pesquisas sobre a Literatura. Durante o Classicismo, marco artístico, cultural e literário que vigorou na Itália, durante o Renascimento, predominou o culto aos clássicos greco-romanos, que foram resgatados, reinventados e publicados em vários países e diferentes línguas
.
Logo depois, com a ascensão do Humanismo, que centralizava o foco das atenções no indivíduo, o escritor passa a ser o núcleo das análises, que passam a se valer dos aspectos biográficos destes artistas, na tentativa de entender suas produções a partir de suas trajetórias existenciais. A partir do século XIX, um novo ponto de vista começa a surgir, com um teor científico, transformando assim a literatura em ciência.
 
Agora os teóricos procuram na obra uma forma de unir a vida do escritor ao contexto sócio-político em que ele viveu e produziu. Este período vê a perspectiva científica triunfar com a ampliação do ideal racionalista inerente ao Iluminismo. Muitos já se referem à ciência da literatura, a qual possui inclusive métodos próprios, que revezam ou combinam padrões biográfico-psicológicos, sociológicos e filológicos.
 
Mas é no século XX, como crêem a maior parte dos pesquisadores, que nasce a Teoria Literária como ela é conhecida hoje, com o surgimento de escolas como a Neo Crítica dos EUA, e o Formalismo Russo. Ambas advogam que os estudos literários devem buscar na própria literatura as fontes necessárias, em uma análise imanente, sem precisar recorrer a outras disciplinas. Eles pretendem se voltar para a compreensão da estrutura literária, das suas características.
 
Ao longo da evolução da Teoria Literária, predominaram duas categorias distintas na forma de analisar as obras:
 – a normativa, que postulava a estética clássica, segundo a qual toda produção literária deve adotar normas inflexíveis, baseadas em um cânone previamente estabelecido, metodizando a forma antes de elaborar o texto; 
- a descritiva, que defendia a estética romântica, a qual concedia ao escritor total liberdade na criação de sua obra, que só posteriormente seria classificada em um determinado gênero da literatura.
 
A Teoria Literária estuda a literariedade, a evolução literária, os períodos da literatura, os gêneros, a narratividade, os versos, sons e ritmos, as influências exteriores sobre a produção literária, entre outros aspectos desta disciplina.
 
 
^^

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

História da arte



Fonte aqui.
 
A história da arte é uma disciplina que estuda a evolução das expressões artísticas, a constituição e a variação das formas, dos estilos, dos conceitos transmitidos através das obras de arte.
Costuma referir-se à história das artes visuais mais tradicionais, como a pintura, escultura e arquitectura.
Se bem que as ideias sobre a definição de arte tenham sofrido mudanças ao longo do tempo, o campo da história da arte tenta categorizar as mudanças na arte ao longo do tempo e compreender melhor a forma como a arte modela e é modelada pelas perspectivas e impulsos criativos dos seus praticantes. Embora muitos pensem na história da arte simplesmente como o estudo da sua evolução ocidental, o assunto inclui toda a arte, dos megalíticos da Europa Ocidental às pinturas da dinastia Tang, na China.
 
Estudo acadêmico
Johann Joachim Winckelmann, no século XVIII, estabeleceu os fundamentos para o estudo da história da arte. Mas esse tipo de história só se tornou uma disciplina acadêmica a partir de 1844, na Universidade de Berlim.
Abordagens sobre a história da arte, no século XIX:
  • Contexto social da arte: ver Jacob Burckhardt;
  • Aspectos formais da arte: ver Heinrich Wölfflin
No século XX, Erwin Panofsky rejeita o formalismo de Wölfflin em seus estudos de iconografia. Ernst Gombrich, foi uma figura importante nessa área, com sua popular divulgação da História da Arte (1950) e seu relativismo cultural. Em recentes tendências dos estudos históricos de arte, a partir dos anos de 1980, houve uma valorização das ideologias de determinados grupos sociais, como os estudos feministas por exemplo.
 

Introdução aos grandes momentos da história da arte

Arte rupestre

A arte rupestre é a primeira demonstração de arte que se tem notícia na história humana. Seus vestígios datam de antes do desenvolvimento das grandes civilizações e tribos, como as do Antigo Egipto. Esse tipo de arte era caracterizado por ser feito com materiais como terra vermelha, carvão, e pigmentos amarelos (retirados também da terra). Os desenhos eram realizados em peles de animais, cascas de árvores e em paredes de cavernas. Retratavam animais, pessoas, e até sinais. Havia cenas de caçadas, de espécies extintas, e em diferentes regiões. Apesar do desenvolvimento primitivo, podem-se distinguir diferentes estilos, como pontilhado (o contorno das figuras formado por pontos espaçados) ou de contorno contínuo (com uma linha contínua marcando o contorno das figuras). Apesar de serem vistas como mal-feitas e não-civilizadas, as figuras podem ser consideradas um exemplo de sofisticação e inovação para os recursos na época. Não existem muitos exemplos de arte-rupestre preservada, mas com certeza o mais famoso deles é o das cavernas de Lascaux, na França.
 

Características da arte na pré-história e suas diferenças com a arte na actualidade:

 
As características da arte na pré-história podem ser inferidas a partir dos povos que vivem actualmente ou viveram até recentemente na pré-historia (por exemplo, os aborígenes, os índios). Na pré-história, a arte não era algo que pudesse ser separada das outras esferas da vida. Ela não se separava dos mitos, da economia, da política, e essas actividades também não eram separadas entre si. Todas essas esferas formavam um todo em que tudo tinha que ser arte, ter uma estética, porque nada era puramente utilitário, como são hoje um abridor de latas ou uma urna eleitoral. Tudo era ao mesmo tempo mítico, político, económico e estético. E todos participavam nessas coisas.
A arte como uma palavra que designa uma esfera separada de todo o resto só surgiu quando surgiram as castas, classes e Estados, isto é, quando todas aquelas esferas da vida se tornaram especializações de determinadas pessoas: o governante com a política, os camponeses com a economia, os sacerdotes com a religião e os artesãos com a arte. Só aí é que surge a arte "pura", separada do resto da vida, e a palavra que a designa.
Mas antes do renascimento, os artesãos eram muito ligados à economia, muitos eram mercadores e é daí que vem a palavra "artesanato". Então a arte ainda era raramente separável da economia (embora na Grécia antiga, a arte tenha chegado a ter uma relativa autonomia), por isso, a palavra "arte" era sinónimo de "técnica", ou seja,"produzir alguma coisa" num contexto urbano. No renascimento, alguns artesãos foram sustentados por nobres, os mecenas (os Médici, por exemplo), apenas para que produzissem arte, uma arte realmente "pura". Surgiu então a arte como a arte que conhecemos hoje, assim como a categoria daqueles que passaram a ser chamados de "artistas".

 Esquema de periodização

O campo de arte se tornou bastante abrangente e pode ser subdividido da seguinte maneira:
Arte da Pré-História
Chûn Quoit (small).jpg
  • Arte do Paleolítico
  • Arte do Neolítico (Arquitectura do Neolítico)
  • Arte rupestre (Pintura) |
  • Arquitectura da Pré-História
  • (Dólmen | Menir | Megálito | Cromlechs)
Arte da antiguidade
Arte da Mesopotâmia
Pergamonmuseum Babylon Ischtar-Tor.jpg
  • Arte da Suméria
  • Arte da Assíria
  • Arte da Babilónia
  • Arte da Pérsia (Arquitectura)
Arte do vale do Nilo
Tutanchamun Maske.jpg
  • Arte egípcia (Arquitectura | Pintura | Escultura)
Arte celta
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  • Arte celta
Arte germânica
Magdalenenberg fibeln.jpg
  • Arte germânica
Arte egeia
MaskeAgamemnon.JPG
  • Arte cicládica
  • Arte minóica (Pintura)
  • Arte micénica (Pintura)
Arte fenícia
Head man Carthage Louvre AO3783.jpg
  • Arte fenícia
Arte da Antiguidade Clássica
Etruskischer Meister 001.jpg
  • Arte etrusca (Pintura)
  • Arte grega (Arquitectura | Escultura | Pintura)
  • Arte helenística (Pintura)
  • Arte romana (Arquitectura | Escultura | Pintura)
Arte do cristianismo
Meister von San Vitale in Ravenna 002.jpg
  • Arte paleocristã
  • Arte copta
Arte da Idade Média
Mekhnes Place El-Hedine Mosaique3.jpg
  • Arte islâmica (pintura)
  • arte mourisca
  • arte mudéjar
  • Arte bizantina (pintura)
Arte pré-românica
Karolingischer Buchmaler um 820 001.jpg
  • Arte dos povos germânicos
  • Arte visigótica
  • Arte hibérnico-saxónica
  • Arte anglo-saxónica
  • Arte merovíngia
  • Arte carolíngia
  • Arte otoniana
Cologne Cathedral.jpg
  • arte românica (Arquitectura | Escultura | Pintura)
  • Arte gótica (Arquitectura | Escultura | Pintura)
  • Arte manuelina
Arte do Renascimento à modernidade
Lady with an Ermine.jpg
  • Renascimento (Arquitectura | Escultura | Pintura)
  • Maneirismo
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  • Barroco (Música)
  • Rococó
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  • Neoclassicismo
  • Academicismo
  • Neogótico
  • Neomourisco
  • Neomudéjar
  • Neomanuelino
  • Romantismo
  • Pré-rafaelitas e Nazarenos
Arte moderna
Gustave Courbet 010.jpg
  • Naturalismo
  • Realismo
Monet Umbrella.JPG
  • Impressionismo
  • Pós-impressionismo
  • Pontilhismo e Divisionismo (Neoimpressionismo)
Gustav Klimt 021.jpg
  • Simbolismo
  • Decadentismo
  • Art nouveau
  • Arts & crafts
August Macke 033.jpg
  • Expressionismo
  • Fovismo
  • Die Brücke
  • Der Blaue Reiter
Juan Gris 003.jpg
  • Cubismo
  • Abstraccionismo
  • Construtivismo russo
  • De Stijl ou (Neoplasticismo)
  • Bauhaus
  • Suprematismo
  • Raionismo
  • Realismo socialista
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  • Futurismo
  • Dadaísmo
  • Surrealismo
Arte contemporânea
Cupola inside Reichstagkuppel 29.JPG
 
  • Pós-modernidade
  • Pop art
  • Op art
  • Art conceptual
  • Happening
  • Fluxus
  • Videoarte
 
 
  • Minimalismo
  • Neoconcretismo
  • Massurrealismo
  • Desconstrutivismo
  • Performance
  • Realismo Socialista
  • Land art
  

 Por localização geográfica

Arte europeia
Arte africana
Arte berbere | Arte mourisca
Arte asiática
Arte do Próximo Oriente: Arte islâmica
Arte do Extremo Oriente: Arte chinesa (Cerâmica) | Arte japonesa (arquitetura | cerâmica) | Arte tibetana | Arte indiana
Arte americana
Arte pré-colombiana: (Mesoamérica) - Arte olmeca | Arte tolteca | Arte maia | Arte azteca | (Andes) - Arte inca
Arte norte-americana: Arte índia
Arte oceânia
Arte aborígene

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Leia Mário Quintana - Eu recomendo!!!




Quando penso numa boa leitura, logo penso em Mário Quintana. Com sua obra fecunda, vale ressaltar algumas, entre tantas...
O livro A Rua dos Cataventos (1940) que foi a sua estreia na poesia, é com um livro de sonetos. Enfatiza as coisas simples da vida com um lirismo ímpar e com uma fina ironia e sarcasmo. Sem se filiar a nenhuma corrente literária, Quintana cultivou versos tradicionais.
Tem também o Canções (1946) - Poesias de sentimentos e emoções singelas. Apresenta também uma visão de mundo espiritualista ou neo-simbolista. Na obra, Quintana afina os instrumentos formais: técnica poética, recursos poéticos e revela um humor mais sutil. Também um certo desencanto e melancolia fazem parte da obra.
Sem falar de Sapato Florido (1948) - Poemas em Prosa. Obra que privilegia a informalidade e uma gama de utilitário verbais, de soluções rítmicas e rímicas. Aqui, aparecem um entrelaçado de sentidos, duplos, alusões, elipses e subentendidos.
Entretanto, o meu preferido é: O Aprendiz de Feiticeiro (1950) – que retrata a maturidade poética de Mário Quintana. Uma simples obra, mas de grande repercussão. Afloram poesias impregnadas de antíteses e paradoxos.
Mas quem quiser um mix dos melhores momentos de várias obras, não pode deixar de ter na cabeceira o livro Poesias (1962) que reúne em um único volume, obras como: A Rua dos Cataventos, Canções, Sapato Florido, Espelho Mágico e O Aprendiz de Feiticeiro. Trata-se de uma visão panorâmica sobre a obra de Mário Quintana: multifacetada, ora com características românticas, ora realistas, outras surrealistas e outras ainda com visão irônica em relação à vida sem sentido do homem contemporâneo. Tudo isso, no entanto, com uma criatividade desconcertante através de textos marcados por enganadora simplicidade.

Mário Quintana sobreviveu aos passadistas escandalizados com o verso livre; aos modernistas que vaiavam o soneto, aos concretistas alérgicos ao discurso, aos épicos que odiavam o lirismo, aos românticos chocados com a crueza.

O poeta enfrentou também os engajados que confundiam ironia com alienação, os pretensos cosmopolitas que o acusavam de provincianismo, além dos entendidos que procuraram segurar o anjo pelas asas, quando tentaram enquadrá-lo num xadrez historicista, estruturalista, marxista, reacionário ou simplesmente pedante.

Afinal, como Mário dizia: "Poeta não é profissão. É um estado de espírito, ou de coma".

Poeminho do Contra
Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!

(Prosa e Verso, 1978)
.
Diziam os amigos mais íntimos, que Mário Quintana era o poeta das coisas simples e fazia pouco caso em relação à crítica. Conforme costumava comentar, sua poesia era feita simplesmente por sentir necessidade de escrever.

Sobre o AMOR:

"Amar: Fechei os olhos para não te ver e a minha boca para não dizer...
E dos meus olhos fechados desceram lágrimas que não enxuguei, e da minha boca fechada nasceram sussurros e palavras mudas que te dediquei....O amor é quando a gente mora um no outro."


 
Danni^^

sábado, 22 de novembro de 2008

Poeta Antônio Roberto

Li no blog do Roberto Moraes:

"Qualquer dia desses, não sei quando, nem por quem, receberemos um poema feito por ele na sua nova morada. Caprichoso e exigente como é na construção dos seus versos, certamente, será um primor! O tempo de lá não é o mesmo daqui. Ficaremos aguardando... Enquanto isso, faremos a leitura do que nos deixou escrito como 'Emoção', 'Nem sempre', 'Manacá', 'Encontro' e tantos outros. (...) Obrigada, Poeta!"



Mas...

"E eu que achei que a lua não brilhasse
sobre os mortos no campo da guerrilha,
sobre a relva que encobre a armadilha
ou sobre o esconderijo da quadrilha,
mas brilha.

E achei que nenhum pássaro cantassese
um lavrador não mais colhe o que planta,
se uma família vai dormir sem janta
com um soluço preso na garganta,
mas canta.

Também pensei que a chuva não regasse
a folha cujo leite queima e cega,
a carnívora flor que o cego inseto pega
ou o espinho oculto na macega,
mas rega.

Pensei também que o orvalho não beijasse
a venenosa cobra que rasteja
no silêncio da noite sertaneja
sobre a ruína de esquecida igreja,
mas beija.

Imaginei que a água não lavasse
o chicote que em sangue se deprava
quando, de forma monstruosa e brava,
abre trilhas de dor na pele escrava,
mas lava.

Apostei que nenhuma borboleta
-por ser um vivo exemplo de esperança-
dançaria contente, leve e mansa
sobre o túmulo em flor de uma criança,
mas dança.

Por isso achei que eu não mais fizesse
poema algum após tanto embaraço,
tanta decepção, tanto cansaço
e tanta espera, em vão, por teu abraço,
mas faço."

[Antônio Roberto]

^^

domingo, 16 de novembro de 2008

Carta - [Mário Quintana]

Mário Quintana:
"Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não astava pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro - o mesmo tendo acontecido a sir Isaac Newton! Excusez du peu… Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz. Dizem que sou tímido. Nada disso! Sou é caladão, introspectivo. Não sei porque sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como os outros?Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de Oliveira, de Érico Veríssimo - que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras."


Obs.: Por isto e por tantos outros motivos, é que este, é um dos meus poetas preferidos...





Meu caro poeta,
Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola tracada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!
Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.
A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.
Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: "Eu não te largarei até que me abençoes". Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técninca dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.
Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.
Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convêm, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.

[Mario Quintana]

^^

sábado, 8 de novembro de 2008


A escritora Clarice Lispector, nesta saudável mania de todo-mundo-copiar-todo-mundo-sem-citar-a-fonte, como se fosse poesia originariamente feita por Clarice. É bom que se diga que Clarice apesar de escrever de forma não versificada, era poeta verdadeira, pois não basta ao texto estar quebrado em linhas para ser poesia. Clarice fazia poesia sem quebrar as linhas.
Esta aí, é uma delas. Agora, vou deixar vc leitor, saborear cada palavra desta linda poesia....

Dá-me a tua mão


Dá-me a tua mão: Vou agora te contar como entrei no inexpressivo que sempre foi a minha busca cega e secreta. De como entrei naquilo que existe entre o número um e o número dois, de como vi a linha de mistério e fogo, e que é linha sub-reptícia. Entre duas notas de música existe uma nota, entre dois fatos existe um fato, entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam existe um intervalo de espaço, existe um sentir que é entre o sentir - nos interstícios da matéria primordial está a linha de mistério e fogo que é a respiração do mundo, e a respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos e chamamos de silêncio.

^^