Procurei por ti por todas estas ruas,
por todas estas casas
onde dormem velhotes e pequenas crianças zombam
dos vizinhos.
Procurei porque nada havia para fazer, e
nada do que fizesse me poderia trazer aqui.
Por isso, perdi-me.
Quando entrava pelas casas, julgava que te via
num quadro,
numa janela,
num retrato
onde me parecia demasiado semelhante a figura dos
lábios ou das pálpebras.
Aprendi que nada era assim. Hoje, seguro
com força os pedaços de papel que se rasgaram
quando comecei a caminhar
e ainda hoje caminho.
As ruas tornaram-se pedaços molhados da minha
consciência - não acredito em nada do que me dizem,
entre as janelas de paredes calcinadas.
A tinta que as rege cai.
Costumo pôr-me a olhar para elas, pensando
quiçá como seria se te desenhasse nelas, ou no
chão. Respondi-me que não poderia fazê-lo, porque
assim o mundo teria demasiado peso para suportar
demasiadas caras que apagar.
Suportamos o silêncio hoje, porque as palavras
já escoam fora do nosso corpo; perdemos o rio que
as mãos se tornam quando nascemos - perdemos a
inocência dos nossos rostos - e agora
vou para ali
para longe
de onde vim.
Perder-me-ei porque assim parece que se torna
necessário para viver.
Vou pedir-te que tenhas um nome antes
de adormecer. Vou ver-te - onde, não sei - mas,
antes disso, antes desse momento - em que se tornem
exíguos os nossos corpos - não direi nada:
não grito.
Permite-me que ecoe por aqui o que se
escreve dentro de mim: escrevo praias onde
nunca mergulhei, ouço conversas dos vizinhos que
doem como gritos, como criticas, como armas
arremessadas contra a minha sombra.
Como te disse: permite-me que me ecoe.
Evitei que me descongregasse pela terra, pensei
que assim poderia tocar-te no ombro e dizer-te
que estou aqui, onde tu não podes ver
onde as crianças não conseguem chegar
onde os velhos não conseguem viver.
Estou por aqui, enquanto te deixo permanecer
no cheiro que trago nas vestes, enquanto me dispo
e deixo que me vejas.
Agora tenho em lugar das minhas mãos uma grande
mancha azulínea, que me recorda que um dia aqui existiu
o mundo e que agora não há mais tempo
para nada.
[Sérgio Xarepe - Em lugar das mãos o mundo]
por todas estas casas
onde dormem velhotes e pequenas crianças zombam
dos vizinhos.
Procurei porque nada havia para fazer, e
nada do que fizesse me poderia trazer aqui.
Por isso, perdi-me.
Quando entrava pelas casas, julgava que te via
num quadro,
numa janela,
num retrato
onde me parecia demasiado semelhante a figura dos
lábios ou das pálpebras.
Aprendi que nada era assim. Hoje, seguro
com força os pedaços de papel que se rasgaram
quando comecei a caminhar
e ainda hoje caminho.
As ruas tornaram-se pedaços molhados da minha
consciência - não acredito em nada do que me dizem,
entre as janelas de paredes calcinadas.
A tinta que as rege cai.
Costumo pôr-me a olhar para elas, pensando
quiçá como seria se te desenhasse nelas, ou no
chão. Respondi-me que não poderia fazê-lo, porque
assim o mundo teria demasiado peso para suportar
demasiadas caras que apagar.
Suportamos o silêncio hoje, porque as palavras
já escoam fora do nosso corpo; perdemos o rio que
as mãos se tornam quando nascemos - perdemos a
inocência dos nossos rostos - e agora
vou para ali
para longe
de onde vim.
Perder-me-ei porque assim parece que se torna
necessário para viver.
Vou pedir-te que tenhas um nome antes
de adormecer. Vou ver-te - onde, não sei - mas,
antes disso, antes desse momento - em que se tornem
exíguos os nossos corpos - não direi nada:
não grito.
Permite-me que ecoe por aqui o que se
escreve dentro de mim: escrevo praias onde
nunca mergulhei, ouço conversas dos vizinhos que
doem como gritos, como criticas, como armas
arremessadas contra a minha sombra.
Como te disse: permite-me que me ecoe.
Evitei que me descongregasse pela terra, pensei
que assim poderia tocar-te no ombro e dizer-te
que estou aqui, onde tu não podes ver
onde as crianças não conseguem chegar
onde os velhos não conseguem viver.
Estou por aqui, enquanto te deixo permanecer
no cheiro que trago nas vestes, enquanto me dispo
e deixo que me vejas.
Agora tenho em lugar das minhas mãos uma grande
mancha azulínea, que me recorda que um dia aqui existiu
o mundo e que agora não há mais tempo
para nada.
[Sérgio Xarepe - Em lugar das mãos o mundo]
^^
2 comentários:
Bonito, mas um pouco triste...
Acho que ela procurou em todo o lugar mas não dentro do coração dela.
Fique com Deus, menina xará Danni.
Um abraço.
A procura por muitas vezes é etena.
bjs
Insana
Postar um comentário