Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo, o que me falha ou finda, é como que um terraço sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio do que não está ao pé, livre do meu enleio, sério do que não é. Sentir, sinta quem lê! [Fernando Pessoa, in "Cancioneiro]

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sábado, 14 de novembro de 2009

No bairro do amor há quem pergunte a sorrir:
será que ainda cá estamos no fim do verão?


Talvez pelo avesso deste mundo deserto eu seja só um atalho fingido. Ao passar de cada pé sou apenas um fôlego cansado. Que desaprendeu como gemer. Um novelo de sentimentos calejados que depois se guarda no canto escondido de uma gaveta sem uso. Porque realmente me magoam as esquinas inquietas. Não estava escrito precisar de ti - assim - a cada instante. Estaria contorcida se não pudesse mais dobrar as palavras. Se não as tivesse por dentro de mim – e se numa impaciência qualquer não conseguisse soprá-las e torná-las mais leves – nesta desordem pacífica. Ouço-me ao ouvido. E relembro com alguma tristeza o pouco que rodopiei nesses abraços. Não é que vá sarar a ferida agora. Afinal esqueço o rumo a cada letra que soletro a custo. Porque contigo rompi as costuras da boca. Há muito que me esmago com os pés e tu não sabes. Não é que te vá socorrer ou te devolva o brilho aos olhos. Não é que me tornes mais solta: serei sempre um navio sem ancoradouro. Mas aqueço-te as mãos sem me deixar derreter. Não é que eu valha a pena: porque sou feita de aflições que me roubam as forças. Lavo o sono com água gelada e – mesmo suspensa – vivo a cansar-me e cresço a tropeçar. Sou desassossego. Mas não fraquejo ao pé de ti. E passas por mim – de dentro para fora – sem me sentires na pele. E eu afogo-me num batimento cardíaco derradeiro. Preparo-me para ser um sorriso espontâneo numa alma que morre aos pedaços. Mas isso eu continuo a pagar – em prestações amortizadas – com estas dores abafadas e fundas. Não sei se hei-de temer o teu rosto encostado ao meu. Não é que te vá segurar nos braços. Porque repeti os gestos num calendário de folhas dobradas e esperei – em segredo – dias mais coloridos que anotei sem pensar a marcador fluorescente também sem perceber que a rotina me sabotava o mínimo esforço. Vivo sem me ver. Talvez seja tempo de voltar atrás sem mágoa ou de seguir em frente sem medo – de sufocar por dentro – de sacudir o corpo de uma só vez. Aqui a noite chega primeiro. E eu não tenho vontades: sou dona de umas mãos vazias. Enquanto tento em vão o equilíbrio dou-me conta de um caminho ainda por decidir. Mas distraí-me: enrolei-me em fios de promessas adiadas. E sem querer trago-te comigo – naquele bolso desobediente onde me cabem os sonhos – aconchegado no peito.

[Jorge Palma]

^^

3 comentários:

. disse...

Continue a sonhar, sempre é possivel...


eu acredito...


beijos dannizinhaaa

Marcelo Mayer disse...

guerra sentimental nos mutila aos poucos

Daniel Savio disse...

Ai, ai, reaja a esta infelicidade menina, nada vale ficarmos tristes, ou que paremos de tentar ser felizes...

Fique com Deus, menina xará Danni.
Um abraço.