"Anda, vamos fugir. Nos meus sonhos só existem os teus olhos e o teu pescoço. Eu agarro-te, agarro-te, mas tu continuas a fugir, a fugir de mim. Foge antes comigo. Senão eu fico aqui só com as minhas mãos e mãos vazias, que não agarram pescoços, nem beijam olhos, são sempre tristes. assim, elas só se agarram a lampiões velhos, de luzes mortiças, e a garrafas sem fundo, que já sabem mal, mas não conseguimos parar de beber, se ao menos tu estivesses aqui tiravas-me esta garrafa das mãos. Mas não estás e só me restam as minhas mãos, mãos vazias, mãos que já não sabem tocar e assim fujo sozinha, fujo para bem longe e quando páro, choro. Depois limpo as lágrimas (chega de ter pena de mim). Encontro outros pescoços, outros olhos, e agarro-me aos pescoços e beijo os olhos e prendo-os cheia de fúria e digo que são meus e que já não vai doer mais, que agora vou ser feliz, desta é de vez, olha que ele até tem um pescoço mais bonito e uns olhos mais suaves, nem lhes chegas aos calcanhares (ou aos olhos, é como quem diz).
Depois percebo que estou errada, os dele até podem ser verdes, mas os teus azuis são tão mais sinceros, aos dele nunca posso olhar diretamente que ele foge, aos teus eu olho durante horas, nem preciso de falar, nem tu, sei o que estás a pensar, sinto o teu pescoço (tão bom) e sei que me vais magoar, mas sou mais feliz assim, presa a um amor de cordel que me agarra e me arranha, mas sei que se te pedisse para fugires comigo, tu fugias, nem que fosse só por um dia.
Se eu pedisse com os olhos cheios de lágrimas e beijasse os teus (os meus castanhos, os teus azuis) tu vinhas comigo, eu sei que vinhas, nem que fugisses no dia a seguir e me deixasses sozinha com as minhas mãos vazias e as minhas garrafas cheias."
^^
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