Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo, o que me falha ou finda, é como que um terraço sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio do que não está ao pé, livre do meu enleio, sério do que não é. Sentir, sinta quem lê! [Fernando Pessoa, in "Cancioneiro]

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sábado, 22 de novembro de 2008

Poeta Antônio Roberto

Li no blog do Roberto Moraes:

"Qualquer dia desses, não sei quando, nem por quem, receberemos um poema feito por ele na sua nova morada. Caprichoso e exigente como é na construção dos seus versos, certamente, será um primor! O tempo de lá não é o mesmo daqui. Ficaremos aguardando... Enquanto isso, faremos a leitura do que nos deixou escrito como 'Emoção', 'Nem sempre', 'Manacá', 'Encontro' e tantos outros. (...) Obrigada, Poeta!"



Mas...

"E eu que achei que a lua não brilhasse
sobre os mortos no campo da guerrilha,
sobre a relva que encobre a armadilha
ou sobre o esconderijo da quadrilha,
mas brilha.

E achei que nenhum pássaro cantassese
um lavrador não mais colhe o que planta,
se uma família vai dormir sem janta
com um soluço preso na garganta,
mas canta.

Também pensei que a chuva não regasse
a folha cujo leite queima e cega,
a carnívora flor que o cego inseto pega
ou o espinho oculto na macega,
mas rega.

Pensei também que o orvalho não beijasse
a venenosa cobra que rasteja
no silêncio da noite sertaneja
sobre a ruína de esquecida igreja,
mas beija.

Imaginei que a água não lavasse
o chicote que em sangue se deprava
quando, de forma monstruosa e brava,
abre trilhas de dor na pele escrava,
mas lava.

Apostei que nenhuma borboleta
-por ser um vivo exemplo de esperança-
dançaria contente, leve e mansa
sobre o túmulo em flor de uma criança,
mas dança.

Por isso achei que eu não mais fizesse
poema algum após tanto embaraço,
tanta decepção, tanto cansaço
e tanta espera, em vão, por teu abraço,
mas faço."

[Antônio Roberto]

^^

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