Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo, o que me falha ou finda, é como que um terraço sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio do que não está ao pé, livre do meu enleio, sério do que não é. Sentir, sinta quem lê! [Fernando Pessoa, in "Cancioneiro]

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quarta-feira, 19 de julho de 2017

Atitude



Minha esperança perdeu seu nome...
Fechei meu sonho, para chamá-la.
A tristeza transfigurou-me
como o luar que entra numa sala.

O último passo do destino
parará sem forma funesta,
e a noite oscilará como um dourado sino
derramando flores de festa.

Meus olhos estarão sobre espelhos, pensando
nos caminhos que existem dentro das coisas transparentes.
E um campo de estrelas irá brotando
atrás das lembranças ardentes.

[Cecília Meireles, in 'Viagem']


^^

terça-feira, 18 de julho de 2017

Minha Sede



Aqui tens a minha sede, as águas dos rios
somente satisfazem a urgência maior
e nada diz de ti esse líquido que a sede sacia:
queria beber-te nas ondas do teu ciúme
e despedaçar-me no desejo dos teus lábios
queria alcançar a nuvem e colher a rebeldia
das gotas exaltantes dos teus beijos
queria a ribeira da tua pele como a água
que rebenta das fontes
e unidos na mesma sede alcançar o êxtase
na cintilação dos mesmos horizontes
queria o incêndio escrito na mesma sede
e morrer no martírio de doçuras de amante

aqui tens a minha sede: fogo e água da tua boca
ardendo no azul duma água murmurante.



[Bernardete Costa]


^^

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Enquanto



...O teu sono não chega e os teus dias são noites sem estrelas, eu pinto para ti o som dos pássaros em cores muito claras.


^^

10\07\2017 - Amor Além da vida?



Se procuro o teu rosto
no meio do ruído das vozes
quem procura o teu rosto?

Quem fala obscuramente
em qualquer sítio das minhas palavras
ouvindo-se a si próprio?

Às vezes suspeito que me segues,
que não são meus os passos
atrás de mim.

O que está fora de ti, falando-te?
Este é o teu caminho,
e as minhas palavras os teus passos?

Quem me olha desse lado
e deste lado de mim?
As minhas dúvidas, até elas te pertencem?



[Manuel António Pina]


^^

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Hora de Amanhecer





Padeci ao frio daquela noite de inverno. Como é de praxe, repeti a dose de uísque e o disco a tocar. Observava da janela quem na rua ali passava, não consegui enxergar nada, nem uma vizinha simpática sequer, estávamos eu e a janela estreita. 
O céu se mostrara nublado desde o amanhecer, e por volta da meia noite o ruido das trovoadas ameaçaram uma longa madrugada de chuva. 
O vento aumentara, e apanhei o casaco que repousara sobre o espaldar da cadeira. Serviria-me de escudo. Passou-se minutos e a chuva apareceu. Comumente a esses dias, as gotas fizeram lembrar-me você. Logo me vi chorando convulsivamente - Já que acabo sempre contendo-o - passava-se apenas de um chuvisco, porem em mim, soava mais que uma tempestade. 
O uísque havia esquentado, larguei o copo no canto da escrivaninha. A chuva tardia havia deixado o perfume de terra molhada no ar. O que eu necessitava mesmo nessa hora, era de um bom e forte cigarro, tipo Charm, para tentar retirar minhas lembranças de você. 
Recordei do gosto do filtro, a pouca fumaça exalada e a densidade deste. Alucinógeno. A poça que se formara no inicio da chuva, havia aumentado. A cada gota, uma poça nova. 
A noite ia se passando, e eu permanecia intacta, no mesmo lugar. É que há noites em que me apavora a ideia de adormecer, pois sempre me resta um pedaço do sonho em meio a realidade do dia, no qual acabo remoendo-me e criando ilusões referentes a você. 
As gotas lavavam a janela do primeiro andar, e eu me contentava em a observar enquanto as horas iam se passando. 
Queria despir-me de tudo que estava acumulado, mas as canções de Elis Regina que tocavam, não me permitiram, pois nessa existência precipitada, imprevisível de noites nada, me fiz em você. 
O despertador tocara as seis e quinze, era hora de amanhecer.

[Letícia Piazza Balbinot]

^^


sexta-feira, 10 de abril de 2015

Sobre a Harmonia




São delicados e sutis os fios da harmonia. Ao contrário da alegria, do entusiasmo, ela é uma das sensações mais discretas. Sua voz é quase imperceptível, feito outra qualidade de silêncio. Ela não é uma gargalhada, é aquele sorriso por dentro, uma sensação gostosa de estar no lugar certo, na hora adequada. Feito um arco-íris depois da tempestade, sua beleza é adornada pelo equilíbrio dentro do derramamento. É um adestramento dos fantasmas internos. 
A possibilidade de aprimorar os pensamentos. É quase como não pensar. Simplesmente, sentimos uma ligação profunda com tudo, um denso bem-estar. Como se tivéssemos uma secreta intimidade com o mundo, certa cumplicidade com o tempo. É como se observássemos descompromissados, ela é uma descontração. Como se o coração batesse pelo corpo todo, mas sem extremada euforia. Uma tranqüilidade dilatada no peito, o olhar satisfeito, a mente entendendo que já nem precisa entender o que é prosa ou poesia. E o mundo inteiro cabendo num abraço. E uma firmeza na carícia, a maturidade que perdeu o cansaço, uma confiança que preenche a existência. 
A harmonia é um contato profundo com a experiência. E o tempo do dia não é mais composto por esperas, ele é vivido. E já não se fala, palavras passeiam pela boca. E já não se escreve, as frases coreografam as paisagens. E já não se ama, o amor vigora em nós. 
A harmonia tem fios muito delicados e sua trama faz a ligação mais suave entre todas as urgências já sentidas. E o chão do sonho é macio, e tudo parece estar alinhavado, numa ligação sem sufocamentos. E a poesia não deseja mais ser nada, vira o afago de um momento. E nas letras a textura de um veludo, como se ao correr pela página, os olhos pudessem ser acariciados. E você tem todas as coisas sem precisar tomar posse delas. Você ama o amor, não o delírio de estar apaixonado. Sinto a harmonia como uma espécie de fascínio pela vida. É quase uma perda de outros apetites, porque se está tão nutrido pela própria companhia. E a gente tem aquela vontade súbita de andar pela noite: não apenas para olhar as estrelas, mas também para por elas sermos vistos.
Harmonia é como se fôssemos inundados pelo mar onde antes só havia um precipício." 

[Marla de Queiroz]

domingo, 5 de abril de 2015

Merecedora




Hoje eu acordei muito feliz. 
Feliz como tenho acordado durante tantos e tantos dias. 
Apesar de tudo. Apesar de tanto. Hoje estou milionária. Eu tenho um céu azul, e infinitos e tenros raios de sol preenchendo todos os pontos cardeais da cidade. Sinto tudo tão meu, porque me sinto tão pertencente a tudo (...) basta eu saber olhar (...) 
Porque eu descobri toda a acepção da palavra gratidão e, desde então, me tornei merecedora... 

[Marla de Queiroz]

sábado, 4 de abril de 2015

Do Amor




"O amor quer a posse, mas não sabe o que é a posse. Se eu não sou meu, como serei teu, ou tu minha? Se não possuo o meu próprio ser, como possuirei um ser alheio? Se sou já diferente daquele de quem sou idêntico, como serei idêntico daquele de quem sou diferente? O amor é um misticismo que quer praticar-se, uma impossibilidade que só é sonhada como devendo ser realizada." 

[Fernando Pessoa]

"Pior do que uma voz que cala é um silêncio que fala".


Simples. Rápido. E quanta força. Imediatamente me veio a cabeça situações em que o silêncio me disse verdades terríveis, pois você sabe, o silêncio não é dado a amenidades.

[Martha Medeiros]


Resgate



É através do nosso resgate, do nosso autoconhecimento que adquirimos condições de não cair na armadilha da manipulação, da necessidade de ser aceito, amado ou de, simplesmente, usar o outro como foco para uma desesperada fuga de um encontro com quem somos. 

Quando não nos cuidamos antes de qualquer espécie de “generosidade”, procuramos, inconsciente ou conscientemente, nosso próprio benefício, por mais que o mesmo, aparentemente, se estenda ao Outro: sentimo-nos úteis, bons, nos sentimos, inclusive, superiores. Por isso, é tão importante ter um vasto olhar para o nosso interior antes de sair por aí oferecendo ajuda ou apontando o dedo como pseudo-psicólogos do mundo. 
Quantas vezes aconselhamos em vez de pedir colo, ou engolimos nossa dor para tentar curar a alheia. E damos fragilmente aquilo que em nós ainda não está firme. Isso não nos deixa mais fortes, apenas mais disponíveis. Isso nos distrai do que precisamos arrumar na nossa própria vida. Isso nos tira, temporariamente, do nosso caminho por talvez achar que a própria caminhada seja mais árdua. 
Mas quando há o investimento pessoal, seja lá o que façamos, fazemos sempre por uma causa mais nobre: para ter um relacionamento amoroso livre de dependências, amizades sem cobranças, uma convivência pacífica com a sociedade em geral e, sobretudo, o altruísmo verdadeiro. 
Por isso, é tão importante ter um vasto olhar para o nosso interior antes de sair por aí com aquela fantasia de salva-vidas (quando os afogados somos nós mesmos). 
Portanto, vá ao encontro do Outro quando estiver encontrado a si mesmo e quando estiver finalmente desistido de abandonar sua própria realidade.
Seja intenso, extenso, inteiro. E, sobretudo, honesto.

[Marla de Queiroz]


  

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

O Sonho



O sonho encheu a noite
Extravasou pro meu dia
Encheu minha vida
E é dele que eu vou viver
Porque sonho não morre.


[Adélia Prado]



^^

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Tarde demais para haver outro dia...






Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia
Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas e eu entardecia
Era tarde, tão tarde, que a boca tardando-lhe o beijo morria.
Quando à boca da noite surgiste na tarde qual rosa tardia
Quando nós nos olhamos, tardamos no beijo que a boca pedia
e na tarde ficamos, unidos, ardendo na luz que morria

Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste o sol amanhecia
Era tarde demais para haver outra noite, para haver outro dia.


[Ary dos Santos – Estrela da Tarde]


^^

sábado, 18 de janeiro de 2014

Silêncio


O silêncio e a mais perfeita forma de música. Nele eu me escondo, me encanto e pernoito as palavras que te irão encontrar. O silêncio é a minha obsessão a minha forma de te escutar. Eu sei que estás aí, que me ouves e me percebes. Sei que sentes os meus silêncios. Eles são os teus também.


 [Pedro Abrunhosa]


^^

sábado, 4 de janeiro de 2014

Uns pozinhos de perlim pim-pim



Não sei se é deste tempo, descolorido e monótono, com o Sol a persistir no castigo da sua ausência, mas dei por mim, pensativo, acompanhado apenas pela voz de Nat King Cole.

Seria melhor não ouvir tais músicas. Se fosse mais prudente teria colocado, no cd, uma etiqueta, de um encarnado bem vivo, com o aviso “Altamente perigoso, requer muita precaução no uso”.
Distraído, como sou, falhou essa prudência e agora estou por aqui completamente fascinado, a sonhar estrelas e amores.

Perante a falta de um Sol que alumie tenho que me contentar, entre tristes suspiros, com um ténue e alvidúlcido luar. Este, a espaços, vai rasgando a escuridão de uma noite, que, cada vez mais, se vai tornando sombria e friorenta.

Como eu gostava de o convencer a voltar. Se pudesse, dizia-lhe que se deixasse de castigos injustos. Juntos inventávamos um plano. Seria tudo muito bem pensado. Falávamos com o Inverno. Lembrávamos-lhe que ao longo de todo este tempo nunca faltou sequer um ano ao serviço e que estava mais que na altura de finalmente ter o seu merecido repouso.

Depois era a vez de acordar o Verão. Dizíamos que era uma emergência. Que o Inverno inexplicavelmente havia desaparecido, sem dar notícias, e que alguém tinha que tomar o seu lugar.

A Primavera, sempre preocupada com a sua beleza, não podia porque assim teria que trabalhar dois turnos seguidos. Já o Outono, entre pedidos de desculpa, lembrou que os dias lhe vão pesando e que, se assim fosse, a sua performance certamente ficaria afectada…

Ai, como seria tudo tão fácil se ele quisesse... Bastavam apenas uns pozinhos de perlim pim-pim, alguma loucura e, claro está, uma boa dose de imaginação.
E o sonho, esse deixava de o ser…



[JFDourado – Uns pozinhos de perlim pim-pim – 08/12/2006]


^^

sábado, 21 de dezembro de 2013

De Novo



Eu quero desaprender para aprender de novo. Raspar as tintas com que me pintaram. Desencaixotar emoções, recuperar sentidos.


[Rubem Alves]



^^

domingo, 1 de dezembro de 2013

Olhando...




Quero você na minha frente, extático, (...) e eu para todo o sempre olhando, olhando, olhando...


 [Adélia Prado]


^^

sábado, 23 de novembro de 2013

Parecia...

 
 
Às vezes parecia que de tanto acreditar em tudo que achávamos tão certo; teríamos o mundo inteiro, e até um pouco mais. Faríamos floresta do deserto, e diamantes de pedaços de vidro.


[Legião Urbana]


^^

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Simples assim...

 
 
A graça da coisa está justamente nas desimportâncias. Quanto menos obsessão por elogios, por cargos e por poder, mais livre ficamos para reparar nas pequenas nuances por trás das afetações. A graça da coisa não tem assento reservado em camarote Vip nem lugar no pódio dos campeões, ela é simplesmente a piada espontânea surgida nos bastidores.
É só desempinar o nariz.


[Martha Medeiros]


^^

sábado, 9 de novembro de 2013

Essencial




A vida tem me afastado de tanta gente, que quando me pergunto quem será que vai restar, uma voz lá no fundo responde: quem for essencial.

[CFA]


^^

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Trajetória



Seja qual for o caminho que optarmos seguir, haverá altos e baixos. E isso é tudo. Se fizermos uma auditoria em nossas vidas, em algum momento questionaremos: “e se eu tivesse feito diferente?”. O diferente teria sido melhor e teria sido pior. Então o jeito é curtir nossas escolhas e abandoná-las quando for preciso, mexer e remexer na nossa trajetória, alegrar-se e sofrer, acreditar e descrer, que lá adiante tudo se justificará, tudo dará certo. 


 [Martha Medeiros]


 ^^