Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo, o que me falha ou finda, é como que um terraço sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio do que não está ao pé, livre do meu enleio, sério do que não é. Sentir, sinta quem lê! [Fernando Pessoa, in "Cancioneiro]

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segunda-feira, 15 de novembro de 2010


Gostaria de descrever a emoção mais simples
alegria ou tristeza
mas não como os outros fazem
procurando chegar a dardos de chuva ou sol

Gostaria de descrever a luz
que está a nascer em mim

mas sei que não se parece
com nenhuma estrela
porque não é tão brilhante
nem tão pura
e é inconstante

Gostaria de descrever a coragem
sem arrastar atrás de mim um leão poeirento
e também a ansiedade

sem agitar um copo cheio de água

Dizendo de outra maneira
daria todas as metáforas
em troca de uma palavra

arrancada do meu peito como uma costela
por uma palavra
contida dentro dos limites
da minha pele

mas aparentemente isso não é possível

E só para dizer — eu amo
corro em círculos como um louco
apanhando mãos cheias de pássaros
e a minha ternura
que afinal de contas não é feita de água
pergunta à água por um rosto

E a ira
diferente do fogo
pede-lhe emprestada
uma língua loquaz

Tudo tão emaranhado
tudo tão emaranhado
em mim
que o senhor de cabelo branco
desfez o emaranhado de uma vez por todas
e disse este é o sujeito
e este é o complemento

Adormecemos
com uma mão debaixo da cabeça
e com a outra
num aterro de planetas

Os nossos pés abandonam-nos
e tocam a terra
com as suas raízes minúsculas
que de manhã
arrancamos dolorosamente

[Zbigniew Herbert]
^^

Um comentário:

Daniel Savio disse...

Mas uma palavra contida dentra da pele nunca é tão simple e facil...

Fique com Deus, menina xará Danielle.
Um abraço.