Dizem que finjo ou minto tudo que escrevo. Não. Eu simplesmente sinto com a imaginação. Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo, o que me falha ou finda, é como que um terraço sobre outra coisa ainda. Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio do que não está ao pé, livre do meu enleio, sério do que não é. Sentir, sinta quem lê! [Fernando Pessoa, in "Cancioneiro]

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segunda-feira, 17 de maio de 2010

A vitória nossa de cada dia


Olhe para todos ao seu redor e veja o que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia. Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não se entende porque não queremos passar por tolos. Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo. Temos organizado associações e clubes sorridentes onde se serve com ou sem soda. Temos procurado nos salvar mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes. Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer a sua contextura de ódio, de amor, de ciúme e de tantos outros contraditórios. Temos mantido em segredo a nossa morte para tornar a nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa. Temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que nossa indiferença é angústia disfarçada. Temos disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior e por isso nunca falamos no que realmente importa. Falar no que realmente importa é considerado uma gaffe. Não temos adorado por termos a sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não temos sido puros e ingénuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer pelo menos não fui tolo e assim não ficarmos perplexos antes de apagar a luz. Temos sorrido em público do que não sorriríamos quando ficássemos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a nossa candura. Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso consideramos a vitória nossa de cada dia.

[Clarice Lispector]


^^

3 comentários:

Daniel Savio disse...

Isto me faz pensar no seguinte, o que adianta ser o dono de ruinas...

Fique com Deus, menina xará Danni.
Um abraço.

Bárbara O. dos Santos. disse...

"Temos procurado nos salvar mas sem usar a palavra salvação"

É verdade..
É impressionante como as pesoas se vão mas a alma fica.E através de palavras como essas eu sintoClarice sempre aqui.Comos efossem amigas de infência, quem sabe me conhecesse ate memso d enascer.Pois partece saber coisas que aind anem sei...
Ai...Essa Clarice...*_*

Ps.:Encontrei seu blog por a caso e adorei.Parece escolher as melhroes músicas os melhroe contos, os melhores escritos e a fotos então?Gostei muito!!!
Virei aqui mais vezes,com certeza.;)

Beijos.
=**

silvioafonso disse...

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A beleza fez morada em
tua vida...


silvioafonso








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